Facticius


A artificialidade é uma condição positiva dos fatos. Bruno Latour



Ele costumava perder o fôlego com frequência. Deixava-se arrebatar por imagens fátuas e embebia-se delas. Nem sempre a distância permitia que fosse muito além disso. Seu estilo de vida implicava numa série de limitações com as quais aprendera a conviver. Ficção por ficção, começou a se dedicar a fetiches. Não só os usava numa forma de compensação como passou a estudá-los, o mesmo estilo de vida lhe fornecia tempo suficiente para esse tipo de atividade.

Estudou os fetiches dos cultos africanos. Chegou ao limite de adotar as idéias de Marx (o sociólogo, não o comediante) sobre a influência fetichista da mercadoria e do seu valor de troca. Começou a perder amigos, em todos seus encontros sociais discutia a respeito do simbolismo da falsidade dos fatos. Tornou-se o modelo perfeito do chato. Só não sabia se sua atitude era real ou um fetiche de si próprio.

Não demorou muito para chegar à parafilia. Constatou isso na exposição de Rodin, depois da oitava visita se autodiagnosticou como agalmatoerasta. Mas durou pouco. Apesar da vida reclusa sempre gostou dos ambientes abertos e, como não tinha companhia para a prática agorafílica, nem dinheiro para a nesofilia. Tornou-se anemofílico compulsivo.

Mas isso não era bastante para ele, precisava experimentar mais. Evitou as práticas dolorosas e as ilegais, as demais provou todas, tricofilia, maieusofilia, pigofilia (que julgou superestimada pela população masculina), podolatria - afinal era um clássico. Chegou a se matricular numa escola de dança de salão só para degustar a coreofilia. Entrou numa comunidade de looners, mas seu interesse se esvaziou rapidamente.

Encontrou muita dificuldade na partenofilia. Para gerontofilia, por outro lado, não lhe faltaram modelos. Não teve coragem suficiente para o frotteurismo, o voyeurismo lhe pareceu muito fácil.

Atualmente está escrevendo um livro a respeito do fetiches hodiernos. Constatou que pés, saltos altos, cintas-liga e lingerie estão em decadência. Mesmo a manteiga ficou tão datada quanto o filme que a sugeriu. Já começou a identificar os primeiros sinais de parafilias tecnológicas e seu estudo sobre a macfilia, especialmente pelo prazer gerado em desbloquear i-phones, está sendo avaliado por uma conceituada revista acadêmica. Também pretende desenvolver mais suas tese sobre etiquetas e legendas.

Nas horas de folga, vaga pelas ruas em busca da ventania.

Comentários

Unknown disse…
bem, ao menos Ventania é mais normal e menos sexual e Fábio é cultura , hahhahahha

bijim
Anônimo disse…
Vou ter que esperar a tese sobre etiquetas e legendas...È muita "filia" para uma cabeça só...
Anônimo disse…
os looners se esvaziaram é a melhor de todas...impagável
Taty disse…
Fetiches? mmmmmmmm............

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