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Mostrando postagens de 2012

Peregrino

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Quando José começou sua caminhada não sabia se ia parar em Belém do Pará, Belém da Judéia ou em Belém, Pensilvânia. É verdade que sua confusa falta de cultura geral fazia com que temesse vampiros se fosse para a última. Só tinha certeza que deveria ir em direção setentrional. Precisava achar o seu norte. Nos primeiros dias a caminhada foi tranquila, ao final da primeira semana os pés começaram a doer e o ritmo dos passos diminuiu bastante. A segunda semana foi de poucos progressos e muita água boricada nas bolhas que tinham se formado. Pouco a pouco foi se tornando um homem calejado. Tilomas formados, o ritmo voltou a aumentar e, em poucos dias já tinha ultrapassado a sua meta. Resolveu descansar por um dia inteiro. Alojou-se num hotel de caminhoneiros na beira da estrada e dormiu o sono dos justos. No dia seguinte, durante o café da manhã, conversando com alguns motoristas, conheceu Jorjão, que transportava milho pipoca no seu Fenemê ´62. Apesar da idade do veículo, Jorjão era moder

Não é o fim

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Segundos linguistas da Nicky Hopkins University de Eufala no Alabama, as línguas maias são descendentes semi-genéticos de uma protolíngua chamada protomaia, ou em maia quiché, Proto Nab'ee Maya' Tzij. O que sempre foi uma questão protuberante para os protozoários. Crê-se que a língua protomaia teria sido falada nas terras submersas de Biotopo Chocon Machacas numa área que corresponde aproximadamente àquela onde hoje em dia se fala pessimamente o inglês da CNN. A primeira divisão zigótica da língua ocorreu por volta de 2200 a.C. quando o huastecano se separou da língua maia original, após os seus falantes terem se desentendido a respeito da palavra correta para designar as lhamas e se deslocarem para noroeste ao longo da costa do golfo do México. A seguir foram os falantes de proto-iucatecano e proto-cholano que se separaram do grupo principal, novamente por questões nominalistas que debatiam se uma rosa continuaria sendo uma rosa se tivesse outro nome e também s

Meu reino por um cavalete

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Cavalete já foi apoio para pintura de grandes obras de arte e instrumento de tortura para grandes mártires. A invenção eleitoral para garantir a poluição visual da cidade foram os cavaletes espalhados em calçadas, gramados, ciclovias, rampas de pedestres. Além da poluição visual, eles são o supra sumo da propaganda ecologicamente incorreta. Sabe-se lá quanta madeira foi usada e quanto de impressão em material derivado de petróleo. O mais irônico disso, pelo menos no meu trajeto habitual é que o candidato que mais gasta madeira e polui visualmente... é do Partido Verde. Fica aqui minha contribuição para a campanha: A cavalete dado não se olha a coligação Para alguns candidatos, o castigo veio a cavalete Quem nasceu para santinho nunca chega a cavalete. Não foi reeleito. Caiu do cavalete. Cavalete bom e candidato eleito a gente só conhece na apuração. Quem faz o cavalete é o dono. Mulher, arma e cavalete de armar, nada de emprestar. Uma estrela d

Im- previsões

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Davam-se como o vinho e a toalha de mesa (Fabrício Carpinejar) Ninguém entendeu quando ele entrou à esquerda ao invés da direita. Não era aquela a direção que os levaria de volta para casa. A irmã perguntou o que é que ele estava fazendo, ele disse que estava indo até ali. Mistério. A namorada olhou para ele com um misto de curiosidade e cumplicidade. Poderia até não saber das suas intenções mas confiava no que ele fazia. Ele poderia até ter a intenção de surpreendê-la, mas sabia que era algo que beirava a impossibilidade absoluta. Além de nunca terem tido segredos entre eles eram tão parecidos que algumas vezes se assustavam com isso. Pegou outra rua que levava em direção oposta à da casa. A irmã se inquietava a cada nova troca de rota. Ela e o cunhado tinham sido convidados para um almoço, algo comum desde que o irmão e a namorada moravam juntos. Ele parou o carro num estacionamento. Pediu para todos descerem. Caminharam meio quarteirão e entraram no cartório. Só a irmã e o cunhado

Um sonho. Uma traição

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Mensagem Já fazia um certo tempo que eu não traía alguém por aqui. Hoje eu não resisti. Se quiser ouvir uma linda versão declamada, clique aqui Um sonho Essa noite eu sonhei que sonhava com você Da janela, através do jardim, te admirava se desnudando Um traje de entardecer púrpura tecido em seus cabelos Aquela rosa estrangulada em cachos de ébano Movendo-se na luz amarela do seu quarto. O ar úmido de sons O ganido distante de um cão ferido E o chão bebendo de uma torneira mal fechada Sua casa é tão suave que desaparece sob o atro calor do verão Uma luz se apaga. A porta se abre Um gato amarelo corre sob o facho de luz em direção ao quintal. O aroma amadeirado da cerejeira exala pelo ar Ouço sua risada espumante Você leva duas orquídeas lavanda Uma no cabelo, outra na cintura Uma cadeia de luzes amarelas   chocantes vem com o crepúsculo Circundando o lago com um halo gotejante Ouço um banjo tocando tango E você dança à sombra do negro tu

As gêmeas

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Mensagem O pai era um fumante inveterado, a mãe tinha uma compulsão paranóica em relação a traças.   Apesar disso todos se chocaram quando as gêmeas nasceram e receberam os nomes de Nicotina e Naftalina. Tanto que o escrevente do cartório exigiu uma declaração do pai assumindo a responsabilidade pelos nomes.   O padre recusou-se a batizá-las. A mãe foi se queixar com o bispo. De nada adiantou. Só receberam o sacramento porque encontraram uma paróquia dissidente da igreja, cujo sacerdote topava qualquer parada.   Os familiares acabaram por chamar as meninas de Tina e Lina, o que não as poupou de todo tipo de gozação quando foram para a escola. Cresceram revoltadas com a situação e nunca perdoaram os pais pelos constrangimentos que passaram.   Tina acabou tornando-se uma extremista radical anti-tabagista, mas sempre foi vista de forma suspeita dentro do movimento. Os líderes do grupo reconheciam que era impossível promover a causa tendo como militante a

Um paradigma a menos

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Mensagem Ela achava que tinha saído com ele apenas para tomar um café. Quando muito uma caminhada pelo shopping   Não se surpreendeu quando ele perguntou se poderia levá-la a um lugar diferente, sabia que ele era um sujeito criativo e aceitou o convite.   Tomou um susto quando ele embicou o carro na entrada do estabelecimento. Chegou mesmo a corar, em seus não poucos anos de vida ela nunca tinha entrado num lugar daqueles.   Era uma mulher extremamente pudica e recatada, nunca imaginou que poderia fazer aquele tipo de programa fora das quatro paredes da sua casa.   Não era tão ingênua a ponto de não saber o que iria acontecer mas, para ela, aquilo era uma coisa de mulheres muito diferentes dela, mulheres liberais...ou liberadas, como definir melhor?   Ao mesmo tempo sentiu, sem tentar demonstrar, um certo entusiasmo com a ousadia dele.   Ele percebeu a mistura de desconforto e excitação nos seus olhos. Elegante, antes de entrar, perguntou de

Um dia de pais

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Mensagem Lendo uma mensagem do Markiano Charam (Filho) me coloquei a refletir o que carrego em mim do meu pai e o que, talvez meus filhos levarão de mim.   Com o meu pai aprendi muito, especialmente a pensar, pesar contrários, formar a minha própria opinião, nem sempre igual a dele.   Aprendi olhar para o passado como lição e para o futuro com muito planejamento.   Aprendi a ser irônico e a entender que muitos não entenderiam isso e outros se ofenderiam (e como se odendem...).   Aprendi a ser generoso e não me apegar excessivamente aos valores materiais.   Herdei o prazer pela leitura. A mania de colecionar tranqueiras. A obssessão por catalogar tudo.   Nenhuma dessas coisas ele me ensinou em conversas e lições, todas foram transmitidas pela sua vida e seus exemplos.   Sendo pai há quase 14 anos também vejo características minhas nos meus filhos que vão muito além da genética.   Posso ensinar matemática, português ou geografia para os

Esplênio em distensão

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Tária não era exatamente uma mulher qualquer, especialmente quando tornava-se imperativa. Combatia ferozmente as mesóclises sem futuro, atribuindo-lhes ênclise quase que subjuntivamente exaltadas. O infinito pessoal preposicionado chegava a lhe causar engulhos nada relativos. Seus amigos eram apenas demonstrativos oblíquos quando lhe acometiam acessos subordinativos. Com o tempo foi se tornando (ou tornando-se) uma louca varrida com piaçava flexionada em átonos. Educadora que era, reconhecia sua queda para o segundo, uma vez que não suportava estar acima dos quintos. Debruou-se laminarmente com o verbos defectivos aplicando emplastros repletos de cânfora. Passou a perambular pelas ruas bradando metilas descompassadas. Louca, louca, louca Tária. Conquistou meu esplênio em pleno inverno. Acalminou-me de forma quente e apaixonada. Louca Tária. A mulher que descontraiu as minhas mais profundas estruturas

Um caso patológico

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Ela definitivamente exibia um estado mórbido típíco da região dos mortos. Uma infusão grego latino a tornou o que era. Casou por dinheiro, como se casavam muitas das romanas de sua época. Lycisca que o diga. Mas não era uma qualquer, instalada nos recônditos das pedras pequenas ela se elevava sobre as oficinas de uma forma quastuosa. Pedia referências sempre. Além de se certificar de todas as comprovações possíveis antes de se envolver com estranhos. Queria ter certeza de que seu objetivo seria cumprido, não era uma garota de programa, queria remuneração de longo prazo. Sabia de histórias medonhas de outras carcamanas que, em troca de parcas garantias, tinham se entregue a picaretas e sido vítimas de ursadas. Não queria saber de trocas frequentes de alicerces. Nem se emparedava sem contrapartidas. Rendeu-se pedagogicamente quando encontrou o seu objetivo. Um ser inteligente que falava várias línguas e fiador de bons costumes. Contraiu matrimônio como quem fecha um grande negócio. C

Bonança

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Mensagem "We are such stuff as dreams are made on." (William Shakespeare)   Quando ele viu aquele rosto algo lhe disse que era conhecido. Extremamente conhecido, apesar disso não sabia exatamente de onde, ou quando.   Ela sorriu para ele e veio na sua direção. Ele retribuiu o sorriso e começou a pensar em formas de driblar a memória que o traia sempre quando mais precisava dela.   Foi salvo pela frase que ela usou para cumprimentá-lo. Não conversavam desde o dia da formatura dela.   As imagens começaram a correr rapidamente pela sua mente. Ele a conhecera na sua festa de formatura. Era a namorada de um dos seus colegas de classe.   Meses depois ele foi à formatura dela, que era da mesma classe de uma das suas primas.   Como ela ainda estava com seu ex-colega, acabaram sentando na mesma mesa e conversaram bastante durante a festa. Especialmente sobre Shakespeare de quem ambos gostavam.   Nos anos seguintes tiveram encontros espo

Vida animal

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Mensagem Quandos os ratos saem o gato faz jejum   Quem não tem cão não caça cocô na rua   À noite todos os gatos são parcos   Pagou o pato mas dispensou o couvert   Cada macaco na sua tribo virtual   Uma andorinha não provoca aquecimento global   Cão que ladra não deixa o vizinho dormir   Macaco que pula de galho em galho quer DST   Lobo em pele de cordeiro é perseguido pela PETA   Gato escaldado não morre de alegria   A perua não se veste na véspera   Focinho de porco não é filtro de linha   Em rio que tem piranha, jacaré vive arranhado   Se correr o bicho pega, a menos que seja uma tartaruga   Filho de peixe, alevino é.   Passarinho que come pedra morre de cálculo renal   Não se cutuca onça. Ponto final

Lux in tenebris

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A vida lhe parecia uma noite interminável. E, de fato, era uma noite interminável. Não que não gostasse totalmente da escuridão mas a lua era uma companhia inconstante mudando de face todas as semanas e as estrelas se tornavam mais distantes à medida que a poluição urbana foi aumentando com o passar dos anos. Desejava o sol, aquele que aparecia nas fotos das revistas com as quais topava nos becos onde se refugiava do frio, mas tudo que encontrava eram sombras e penumbra. Algumas vezes acreditou que tinha encontrado a vereda que o levaria à luz. Entrou em túneis longos e úmidos imaginando encontrá-la no final deles. Saiu de todos e cada um deles de volta ao breu. Até o dia em que chegou à conclusão que a tal vida ensolarada era apenas uma ilusão criada pela literatura e pela imprensa. E desistiu de procurar. Passou a se contentar com a aparição quase mensal da lua cheia. Nem sempre surgia, se escondendo atrás das nuvens de alguma frente fria. Eventualmente, em noites mais claras, fixa

Desafiando Neruda

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Posso escrever os versos mais felizes essa noite. Escrever, por exemplo: "A noite está nublada e se escondem, ao longe, todas as angústias" O vento da noite aquietou e o céu está em silêncio. Posso escrever os versos mais felizes essa noite. Eu a quero e todas as vezes ela também me quer Em noite como essa a tenho em meus sonhos e a beijo sem parar sob o céu infinito Ela me quer e todas as vezes eu a quero também Impossível não amar os mais lindo de todos os olhos. Posso escrever os versos mais felizes essa noite. Saber que a tenho. Sentir que nunca a perderei Ouvir a noite imensa, ainda mais imensa com ela Os versos caem na alma como uma tromba d´água Que me importa se a noite está fria e chuvosa Se a guardo no meu coração. Isso é tudo. Ao meu lado a música continua Minha alma está contente de tê-la Como para me achegar a ela meus olhos a vem Meu coração a tem e ela está comigo Na mesma noite que escurece todos os gatos Nós, desde sempre, nos tornamos um Eu a quero, é cert

Pancetta atômica

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Mensagem A despeito do patronímico, Hilário era um sujeito taciturno e macambúzio, não poucas vezes sorumbático.   O que não o impedia de desenvolver suas atividades profissionais de forma metódica e eficiente, lidava bem com as pessoas, mas não permitia nenhum tipo de aproximação que ultrapasse os limites da formalidade.   Seu estilo soturno também não o impediu de se casar e ter filhos. Estela, a esposa, era uma mulher alegre e divertida e apaixonada pelo marido.   Hilário, além de calado e metódico, era também um homem cheio de manias. Rejeitava quase a totalidade dos equipamentos modernos, usava o computador por necessidade profissional mas, em casa, se recusava a ter como cafeteiras elétricas (ainda que tivesse se rendido ao filtro de papel), máquinas de secar roupas (o sol e o vento existiam para isso mesmo) e, menos que tudo, forno de microondas.   Estela não dava bola para a cafeteira, afinal, quem fazia o café era sempre Hilário, ne

Português pós-moderno

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O prefixo "equi" tem originalmente o sentido de plano, justo, liso. Na língua portuguesa indica coisas iguais ou muito similares, como podemos notar em palavras como equilátero, equidistante e o verbo equiparar. Quando queremos nos referir a algo que é diferente usamos outros prefixos como "para" (paradoxo, paródia) ou o mais radical "anti" (antitetânica, antítese). Isso posto, gostaríamos de revisar algumas definições que os nossos dicionários teimam em publicar de maneira errônea: Equino : se refere a cavalos da mesma espécie. Dois cavalos árabes são equinos. Um cavalo árabe e um quarto de milha são apenas paraquinos Equipe : grupo de pessoas que se reúne para praticar um esporte ou alguma atividade competitiva. São consideradas equipes de verdade todas aquelas formadas por pessoas iguais. Os tenistas Bob e Mike Bryan, tenistas gêmeos, são uma equipe. O time do Corinthians, pela sua diversidade é uma antiquipe. Équidna : um ser muito estranho e quase ú

Desaforismos sabatinais

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Mensagem De vez em quando me pego pensando em voz alta e descubro que é o eco. Nenhum slogan, por mais pegajoso que seja, acrescenta conteúdo a uma ideologia vazia Apesar de parecer que não, todos os dias chegam ao seu fim. Separação é como guerra, apesar dos esforços de propaganda, nenhum dos lados tem razão. Questionada sobre as qualidades dele ela emudeceu, Nunca tinha sido apresentada a elas. Pegue uma idéia da qual você discorde. Distorça-a até ela se voltar contra quem a criou. Depois é só olhar o circo pegar fogo.

A professora de sueco

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Ernani conheceu Linnea numa festa das nações no clube. Ele estudante de direito, ela secundarista e filha do cônsul sueco no Brasil. Paixão à primeira vista. Mal ele se formara, ela disse que o pai estava sendo transferido para Seychelles. Ele não teve dúvida, pediu-a em casamento, que aconteceu poucos meses depois. Tiveram três filhos Lennart, Ingrid e Axel. Todos educados de forma bilíngue, falavam fluentemente português e sueco. Para que não perdessem a prática, a mãe só falava com eles em português se fosse em algum papo sério com a presença do pai. Ernani nunca se importou com as conversas corriqueiras numa língua que não entendia e, quando iam para Malmö visitar a família a mulher e os filhos lhe serviam de intérpretes. Até o dia em que descobriu que no mesmo prédio da firma havia uma professora de sueco. Foi conversar com ela na hora do almoço. Queria aprender a língua, mas ninguém poderia saber que ele ia lá, queria fazer uma surpresa para a família na próxima vez que viajassem

Casos heterodoxos

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Ela se considerava uma equação de terceiro grau, até se apaixonar por um matemático quando, enfim, se tornou uma mulher resolvida. Ele admitia que ela não tinha nenhum diferencial, ainda assim a amava de forma integral. Todos a achavam brega por ficar mandando beijos no coração. Ela se justificava dizendo que sua frustração era não ter conseguido ser cardiologista. Ela sempre sonhou em usar um sapatinho de cristal. Acabou no pronto socorro depois de pisar numa garrafa quebrada e encher o pé de cacos de vidro. Ele achava que até matar baratas era crime ecológico, o que nâo o impediu de chutar o fox paulistinha que urinou na sua perna. Passou a vida inteira na corda bamba. Se aposentou com artista circense depois de 50 anos de serviço.

Um só coração

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Mensa Não me venha Vinicius com essa história de amor infinito enquanto dure... se é infinito é também eterno. Não me venha Drummond com essa história de o primeiro amor passou....se passou não era amor. Não me venha Rachel de Queiroz dizer que o amor começa a morrer no dia que nasce, o amor não é apenas uma célula (ou, como diria Deleuze, são organismos que morrem, não a vida). Não me venha Gautier dizer que só a arte é eterna, nenhuma arte se constrói fora do amor. Não me venham tantos outros falar do amor verdadeiro, amor falso não é amor O que o meu coração se lembra todas as manhãs são as palavras do mais sábio de todos os homens, Salomão, que escreveu: " As muitas águas näo podem apagar este amor, nem os rios afogá-lo; ainda que alguém desse todos os bens de sua casa pelo amor, certamente o desprezariam. " O que meus poros exalam em todos os momentos são os versos de Becquer Podrá nublarse el sol eternamente; Podrá secarse en un instante el mar; Podrá

Certezas e dúvidas

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Certezas Quem vive de memórias não coleciona novas lembranças. Algumas pessoas valem a pena, outras nem a penugem. Dinheiro não traz felicidade, nem o contrário. Carta marcada é coisa do Detran Muita gente confunde sinceridade com falta de tato Outras confundem falta de serviço com dedicação... Dúvidas Por que as pessoas admiram as borboletas mas continuam matando taturanas. Num corporação de canibais, o RH cuida da ingestão de pessoas?

O varal da vizinha

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Joel morava num apartamento simples. Quarto, sala, cozinha e banheiro e uma apertada área de serviço que desembocava num armário que o corretor chamou de despensa. A área, um corredor entre a cozinha e o tal do armário, não tinha janelas (a roupa seca mais rápido, dizia o corretor, sem pensar nos dias de chuva) o que permitia uma visão panorâmica do varal da vizinha. Vizinha que Joel nunca vira mais gorda, nem mais magra. Só sabia que era uma mulher pelo que via pendurado no varal. Aliás, sabia da vida da moradora pelo que olhava pela janela. Ela devia fazer a mesma coisa comigo, ele imaginava. Começou a analisar os hábitos. Ela nunca usava calça comprida (deve ser crente), gostava de roupas estampadas ou coloridas. Era ousada na lingerie. Certamente não praticava esportes pois nenhuma tipo de vestimenta esportiva aparecera no varal. Um dia, ao chegar em casa, descobriu que a vizinha tinha um namorado. O homem subira com ele no elevador e entrara no apartamento da dona do varal. Só pod

Caiu na rede é peixe

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Caminhava eu tranquilamente pelas estradas da rede social quando, repentinamente, fui abduzido por um facho de luz que me dizia: "- Você foi adicionado à minha lista de amigos, seu código é 27-523-X" Do alto de uma mangabeira, saguis e babuínos urravam: "- Curti! Curti! Curti!", Tentei me desvencilhar e bloquear o ser extra-virtual que sugava as minhas informações, mas ele me arremessou em direção a outro facho de luz me etiquetando a testa com um "Encaminhado". Comecei a gritar: "- F1! F1!! F1!!!" No entanto a rede parecia não entender meus comandos , pois só aceitava touchscreen. Fui compartilhado, comentado, escrutinado, marcado e, até, re-piado. Quando achei que estava escapando, uma cloud se formou sobre a minha cabeça e me inundou de jogos, aplicativos e eventos que eu não podia recusar. Fui escoado por um longo tubo em U que me trouxe de volta à minha página, sem perceber que fotos pornográficas tinham sido publicadas no meu mural durante

Caminhos cruzados

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“Love seeketh not itself to please, nor for itself hath any care, but for another gives its ease, and builds a Heaven in Hell's despair.” ― William Blake, Songs of Innocence and Songs of Experience Nascido em Boituva, João mudou para São Paulo na adolescência, quando o pai foi transferido para a sede da empresa. Foi morar na Avenida Higienópolis 500 e estudar no Rio Branco. Maria, paulistana da clara, nasceu e morou até casar na Higienópolis 481, em frente ao prédio de João. Menina recatada, estudava no Sion Devem ter se cruzado centenas de vezes no meio dos caminhos do bairro. Nunca souberam que o outro existia. Entraram na faculdade no mesmo ano. Maria foi cursar Direito no Mackenzie. João, engenharia na FAAP. Frequentavam a mesma padaria Barcelona, a mesma farmácia da Angélica e até a mesma loja de CD´s da Vilaboim. Maria conheceu Victor no preparatório do exame da ordem. Casaram dois anos depois na capela do Sion. Tiveram duas filhas, se separaram antes de completarem 10 anos d