Pancetta atômica

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A despeito do patronímico, Hilário era um sujeito taciturno e macambúzio, não poucas vezes sorumbático.
 
O que não o impedia de desenvolver suas atividades profissionais de forma metódica e eficiente, lidava bem com as pessoas, mas não permitia nenhum tipo de aproximação que ultrapasse os limites da formalidade.
 
Seu estilo soturno também não o impediu de se casar e ter filhos. Estela, a esposa, era uma mulher alegre e divertida e apaixonada pelo marido.
 
Hilário, além de calado e metódico, era também um homem cheio de manias. Rejeitava quase a totalidade dos equipamentos modernos, usava o computador por necessidade profissional mas, em casa, se recusava a ter como cafeteiras elétricas (ainda que tivesse se rendido ao filtro de papel), máquinas de secar roupas (o sol e o vento existiam para isso mesmo) e, menos que tudo, forno de microondas.
 
Estela não dava bola para a cafeteira, afinal, quem fazia o café era sempre Hilário, nem com a máquina de secar que achava um trambolho e, de qualquer forma, não caberia na área de serviço. Já o forno de microondas era uma demanda desde o primeiro dia da lua de mel.
 
Quando as crianças nasceram ela passou a fazer campanha ostensiva, especialmente na hora de esquentar as mamadeiras e as sopas. Um dia Hilário cedeu, mas deixou claro que ele não colocaria a mão no aparelho. E assim foi.
 
Estela fez cursos, leu manuais e, em poucos meses, era especialista em microondas. Chegava ao requinte de fazer receitas complexas usando o inimigo número 1 de Hilário, que nunca admitiu gostar de qualquer prato que ele percebesse tivesse sido feito ou esquentado no tal forno.
 
Um dia Hilário foi para o fogão, como costumava fazer de vez em quando, e preparou sua especialidade: omelete. Não era qualquer omelete, rica em ingredientes e temperos exóticos que só ele sabia quais eram, sempre era demandada pela família.
 
Deixou a omelete pronta e foi tomar banho. Quando voltou para o jantar a mesa estava posta com os demais pratos e a omelete dentro do microondas para esquentar. Olhou feio, mas não quis criar caso com a mulher na frente das crianças.
 
Todos à mesa e, do nada, começaram a ouvir barulhos. POF!! POF, POF, POF!
 
POF, POF, POF, POF, POF....era a omelete dentro do microondas explodindo como se estivesse fazendo pipoca. Hilário deu um pulo e tirou o forno da tomada antes que explodisse tudo. Estela,atônita, não entendia nada, afinal nada que ela conhecesse impedia o uso do microondas para esquentar omeletes.
 
Aberta a porta do forno, o desastre estava armado. Pedaços de omelete para todos os lados. Uma baderna só.
 
Hilário olhou para Estela e, pela primeira vez na sua vida teve um ataque de risos. Incontrolável. As crianças, que nunca tinham visto o pai tão alegre, começaram a rir juntas. Estela enfrentou a situação com seu bom humor habitual, culpou a pancetta que Hilário tinha usado na preparação do prato, limpou toda sujeira e pediu que o assunto nunca mais fosse mencionado.
 
De nada adiantou o pedido. Todas as vezes que alguém falava no microondas, o assunto da omelete atômica ressurgia. E Hilário tinha outro ataque de risos.

Comentários

Taty disse…
Ataque dos ovos assassinos! Dei muita risada e não sei porque, mas lembrei do filme animado sobre a fuga das galinhas. Beijos

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