O medo

Januário amava Camões. Tudo que fosse referente ao poeta luso lhe interessava. Já decorara toda a lírica e não poucos cantos de Os Lúsiadas.

Durante sua vida vários exemplares passaram por sua mão. Edições de bolso, capa duras, edições brasileiras e portuguesas.

Apesar da sua paixão pelo tema, Januário nunca foi apegado aos livros. Esses estavam sempre disponíveis em algum lugar, pensava ele.

Conforme lia novos exemplares, guardava-os por um tempo, mas não se incomodava em dá-lo para outras pessoas ou para bibliotecas.

Até o dia que um amigo advogado mencionou um autor alemão, Wilhelm Storck, que tinha escrito uma biografia e análise da obra de Camões no século XIX.

No dia seguinte ele partiu em busca dela. Mandou e-mails para livreiros conhecidos, pesquisou em comunidades de redes sociais.

Finalmente encontrou-a. Soube de uma pessoa que tinha um exemplar. Foi visitá-la para tentar negociar a compra do livro.

Descobriu que o dono não dava muito valor para o tesouro que tinha. Era uma primeira edição portuguesa de 1897. Uma peça única.

Januário devorou o livro, uma duas, três vezes. Ficou absolutamente apaixonado pelas suas qualidades, sua beleza e sua perfeição.

O que fez com que ele mudasse completamente seu comportamento.

Ao mesmo tempo em que deixou de se interessar por qualquer outro livro, ele também se apegou aquele de uma forma como nunca tinha acontecido antes.

Não só decidira nunca mais abrir mão do seu exemplar raro e único, como também não deixava que as pessoas se aproximassem dele, quanto mais tocá-lo.

Se quisessem poderiam admirar de longe. O livro era o seu orgulho e sua vida.

Fez com que ele, pela primeira vez na vida, conhecesse o que era o medo de perder.

Comentários

Deu até medo de ler... mas no fim das contas é um texto lindo

beijos de segunda
Juliana disse…
E não é que o livro existe mesmo? Nunca sei quando você está falando sério.

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