O olho de talião


 

para Jayme Serva, voz que clama no deserto

Autoritarismo não é exatamente algo recente na história da humanidade, assim como nunca foi privilégio de alguma corrente ideológica, nem de raças tribos, povos ou nações, apenas variações de formas de sua aplicação.

O exercício da “otoridade”, a prática de arbitrariedades autoritárias por pessoas que se acreditam imbuídas de algum poder, comumente na burocracia empoderada atrás de um escrivaninha, também não chega a ser algo inédito ou sinal dos tempos, basta ler um pouco da literatura a partir do século XVIII (antes disso as “otoridades” não davam seu imprimatur a quem as contestava) ou da história desde sempre, para encontrar exemplos de abuso desse suposto poder.

Se ainda não existe, alguém que se dedicasse a estudar os micro autoritarismos provavelmente poderia escrever uma enciclopédia volumosa.

E, por mais que isso nos pareça absurdo, sempre surgem novos autoritarismos, seja pela mudança da estrutura social, seja pela cultura dominante de cada época.

Em um mundo onde as pessoas estão cada vez mais autocentradas e criando novos guetos, não é de surpreender que, apesar do discurso bom-mocista, a alteridade e o respeito ao contraditório caminhem a passos largos para o pântano – até porque um mísero brejo não seria capaz de acolher todas essas novas “otoridades”.

A diferença básica é que ao invés de prender e arrebentar os que lhe são diferentes ou contrários, a prática contemporânea é a de cancelar e tentar acabar com a reputação do discordante, até por que os menos convictos se pelam de medo de ficar de fora do universo digital.

As novas tecnologias que deveriam aproximar as pessoas ao invés de enriquecer o processo civilizatório, estão provocando uma regressão acelerada. A cada dia estamos mais próximos das práticas medievais, como já bem percebeu Cédric Durand. Os feudos se multiplicam e os novos senhores feudais tornam-se a cada dia mais violentos e cruéis.

Inquisição, caça às bruxas, fogueiras virtuais e muita tortura nas masmorras das redes sociais é o conjunto de riscos que está sempre pairando sobre a cabeça daqueles que ousam discordar do discurso oficial da igreja da modernidade. E, como a modernidade é líquida, ninguém sabe se o alinhamento de hoje não será a heresia de amanhã. Haja mea culpa.

Com esse passos largos, agora turbinados pela velocidade exponencial das redes, não vamos demorar muito para sairmos da idade média e chegar ao código de Hamurabi e sua conhecida lei de talião, afinal basta voltar até 1700 a.C. Daí para o neandertal é só mais um pulinho.

Salve-se quem puder!

Descrição da imagem: foto da masmorra do Castelo de Rothenburgo na Alemanha e seus instrumentos de tortura

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