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Mostrando postagens de março, 2011

Reencontro das águas

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Fez, pois, Deus o firmamento, e separou as águas que estavam debaixo do firmamento das que estavam por cima do firmamento. E assim foi. (Gênesis 1:7) Sobre o mar, ondas Brancas virando cinzas virando azuis virando negras Virando suas águas sobre o mar Sob o céu o mar imenso Verde virando azul virando espuma virando vapor Virando de volta água nas nuvens Como nuvens sobre o mar Todo dia se enche de amor Meu coração Derramando-se sobre o meu mar que é você Como mar sob o céu Todo dia devolve o amor Seu coração Evaporando-se para a nuvem em que o recebo Como mar Como nuvens Eterna comunhão das águas Como você Como eu Eterna comunhão do amor Imagem : detalhe de quadro de Virginia Susana Fantoni

Absinto

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Ela comia os meus corações com mesóclises enquanto descia pelo meu esôfago o doce árabe calafetado. Súbito, seu cúbito veio ao encontro da minha mão esquerda, enquanto suas saboneteiras vinham de encontro a meus lóbulos flamejantes. A multidão, disposta a corroer garatujas, aglomerava-se para observar a cena. Nem patrocínio, nem mecenas de Micenas garantiam nada em caso de sinistros. Levantaram-se-me minhas pálpebras com um ligeiro movimento pseudopático. Livrei-me das inconvenientes lantejoulas do seu vestido obnubilado de prismas hematófagos. Estava a ponto de interromper tudo, pois não me agradava a audiência desqualificada, quando um bando de gralhas asininas avançou vorazmente sobre a caterva, consumindo-a à vinagrete. Um consommé. Ela me olhou com seu olhar tórico, sempre sedutor e, sem mais astigmatismos, sucumbimos em rompantes glaucos.

Rio das pedras

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Victor parou diante do quadro que estava na entrada da exposição. Uma paisagem onde uma corredeira atravessava a floresta de tons outonais. De um ponto de vista a água parecia correr da base para o topo do quadro. De outro ângulo teve impressão que corria no sentido inverso. Começou a se movimentar em torno do quadro. Dava alguns passos. Parava. Mais alguns passos. Parava de novo. De repente notou que uma mulher o observava. Ficou sem jeito e já ia entrar para ver o resto da exposição quando ela o interrogou: " - Pelo jeito você gostou da pintura..." " - Sim, sim, muito. É um quadro muito bonito. E enigmático. " - Enigmático? Acho que nunca ouvi essa expressão a respeito dos meus quadros." " - Ah! Você é a pintora? Posso te fazer uma pergunta?" " - Claro, se eu souber responder..." " - A direção do rio... ele está subindo ou descendo?" " - Que impressão que teve?" " - Não sei. Em alguns ângulos subindo, em muitos ou

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Vida transformada nesse desejo Intenso, doce, calmo e voraz Recebe meu poema, minha paz Grato te entregando um novo beijo Início, sempre início, sem ter pejo Nenúfar que uma noite quente traz Idílio que nenhum temor desfaz Aonde brilham olhos, onde os vejo. Surpreendente foi tanto sentimento Um só coração um só movimento Sarando cada chaga do meu peito Agora e sempre entrego meu respeito Num arremedo pobre de terceto A eterna surpresa deste soneto

Chifre de unicórnio

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Quando ela chegou no começo da noite encontrou o marido na cozinha lavando a salada. Estavam ambos cansados do esforço do dia. Ele a beijou e disse que estava preparando um lanche leve para os dois. Na hora que ela estivesse pronta poderia vir para a mesa. Comeram salada com carne grelhada. Ela não deixou que ele voltasse para a pia e, assim que acabaram, ela lavou a louça. Sentaram para ler mais algumas páginas dos "Diários da Ana Sus" e foram deitar. Ela passou a noite sonhando com unicórnios, florestas, cavalos alados. Ele dormia tão profundamente que nunca lembrava dos seus sonhos. mas percebeu quando ela levantou às 4 da manhã, toda afobada. Perguntou o que tinha acontecido, ela só disse que já voltava. Ele a ouviu caminhando para a cozinha. Na volta, debruçou-se sobre ele e o beijou longamente. Ele não entendeu, mas gostou. Durante o café da manhã ela explicou o que acontecera. No meio do seu sonho o unicórnio, ao invés de um chifre, tinha uma frigideira na testa. Ela l

Fábulas fabulosas

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Era uma vez uma mulher maravilhosa que vivia numa terra onde ninguém nunca podia entrar. Por isso mesmo era impossível descobrir o quanto ela era maravilhosa, mas a simples menção do seu nome atraia todo tipo de aventureiro ao local. A única entrada da terra tinha um porteiro eletrônico que respondia todas as chamadas através de procrastinações. Todos que tentaram adentrar esse mundo ficaram esperando no portal enquanto a guarda ia ver se era possível conceder o acesso. Um dia, um príncipe desencantado passou por aquelas bandas tão tão distantes e reparou na multidão que se aglomerava no portão. Informado de que, além grades, vivia uma princesa, resolveu conhecê-la. Já sabedor do que aconteceria se pedisse ao porteiro eletrônico para entrar adotou uma estratégia diferente. Quando a portaria o atendeu, ele disse que seu guaxinim de estimação tinha fugido de casa e entrado naquele local. Ele precisava entrar para tirá-lo de lá antes que o mesmo comesse todas as amoras douradas da proprie

Impossível

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Ela era apenas uma imagem. Ou melhor, uma coleção de imagens que ele colecionava na memória cada vez que a via. Ainda que ele a soubesse real, sabia que era de uma realidade impossível de ser alcançada. As migalhas que caiam da sua mesa lhe supriam, ainda que nunca pudessem ser o bastante. Nunca soube como foi que um certo dia ela lhe dirigiu a palavra. Mas percebeu claramente como sua voz era encantadora. Tomou coragem e arriscou um diálogo. Sua pretensão foi recompensada com os comentários que ela fazia ao que ele dizia. Ficaram amigos, mas ele, por mais apaixonado que estivesse, não se iludia de que pudesse ter alguma chance. Teve. Demorou, mas teve não só uma chance, mas toda as oportunidades que o universo, em conspiração, lhe ofereceu. Ele não perdeu nenhuma delas. E todas as noites ia dormir achando que estava no meio de um sonho. Era um sonho. Um sonho real, palpável. Um sonho repleto de forças e fraquezas. Um sonho pleno de amor. Ficou ainda mais surpreso quando ela lhe disse